sábado, 16 de setembro de 2017

Fred Xifarote

O az, manilha e rei de todos os Cow-boys
1.ª Proeza – A traição do “Abutre Peçonhento”


Tarde quente de verão. Nem uma brisa sequer (se quer, não faça cerimónia…) refresca o pinhal de Goal-Average – Off-Side. Um calôr abrasador, daquele que transforma a margarina em manteiga e esta em banha… cá, não tenha mêdo!
Encostadinho a um pinheiro manso, tão manso como um cordeiro branco, Fred Xifarote dorme, pela sexta vez,… a sesta. A seu alado a espingarda, caída no solo, parece dizer ao amo:
Dorme que eu velo
Sedutora imagem
Grata miragem
Plim! Plim! Plim!
Parece dizer, mas não diz, porque uma espingarda não fala e mesmo que falasse quem é que lhe havia de puxar o gatilho em caso de perigo?
 De súbito (estas coisas são sempre de súbito…) um vulto deslisa até junto do atlético Xifarote e contempla-o demoradamente.
Examinêmo-lo E’ um índio horrendo, pintalgado de várias côres e cujos dentes indicam ausência de escova.
O seu olhar mefistofélico revela crueldade, maus instintos. Alma tigrina, fígados de chacal, patranhas de entera, desculpem, entranhas de pantera. Resumindo, concretizando e em síntese: O índio era uma fera com configuração humana e pele avermelhada. Dormindo sempre e sonhando, Fred respirava a largos haustos uns átomos de brisa que de longe em longe lhe passavam rentes às dilatadas narinas. Mal sabia êle – o mísero! – o suplicio atroz que o aguardava!
Mas o destino também vela!
O índio, ao tentar estrangular Fred Xifarote, pizou uma unha encravada a um grilo e êste lavrando o seu protesto barafustou: cri, cri, cri… Xifarote, cujo sono leve tinha fama em todo o território do Alaska, abriu os olhos e fixou o seu inimigo. Este, sabedor, decerto, da força prodigiosa de que Fred dispunha, mudou de jogo fisionómico e sorriu!
O grande maroto sorriu!
Desconfiado, Xifarote interpelou-o:
- Quem és tu?
- Saiba o «rosto pálido» que eu sou o «Abutre Peçonhento». Não me movem quaisquer maus instintos. Pelo contrário! Desejo fumar o «Cigarrinho da Paz» com vomecê!


Fred Xifarote, iludido com o ar franco e leal.. da Camara, do «Abutre Peçonhento, pôz de parte as reservas e começou quebrando uma pinha. Finda a curta tarefa, estendeu um braço para o «Peçonhento» e garganteou:
- Toma lá pinhões…
Enquanto mastigaram a frugal refeição, nada disseram, logo que findaram a trituração dental das sementes de pinheiro, dialogaram:
- « Abutre Peçonhento», indicas-me o caminho mais curto para chegar a Ca-Xarias Town?
Há muito tempo já que não venho para estes lados e estou com receio que a memória me atraiçoe… foi o demo não ter trazido comigo o fiel Zabumba…
- Algum seu amigalhaço, não é verdade?
- Não! Um cavalo que vôa como o vento, raciocina como um bípede e dança o maxixe na perfeição…
- E porque não veio êle?
- Está atacado de reumático nos cascos…
- Coitado! Pobre bicho! Mas não se incomode… Eu serei o seu guia, o farol, o seu farol da … Guia!
E lá foram…
 *****
A três milhas de distância, na direcção S.O.S. – S. O.4.H2 o «Abutre Peçonhento» estacou e pediu vénia a Xifarote para matar uma formiga que supunha ser acuçar o pescoço do fenomenal cow-boy.
Traição! Traição! Traição!
Quando Fred o confiado, o boa pessoa, o coração crédulo, abaixava a perdiz (perdiz ou cerviz,é uma coisa assim…) «Abutre Peçonhento» aplicou-lhe tão violento sôco que Fred, apesar de rijo, não se aguentou nas pernas…
Tremeu, tremeu, tremeu
e caiu silencioso…
*****
Meia noite. Os mochos e as corujas piam sinistra e lugubremente. A Lua sorri, alheiada do que vai na Terra.
Amarrado a uma árvore, Fred Xifarote, imitando a Lua, sorri também.
Ináudita a coragem deste homem! Há curtos instantes, agora, agora, ainda não há meia hora, recuperou os sentidos que havia perdido no pinhal supra-mencionado e já encara a situação com uma fleugma própria de todos os seus xifarotaceos antepassados. Na sua frente, arreganhando a dentuça pessimamente escovada, o traidor «Abutre Peçonhento» ameaça-o com uma faca:
- Finalmente! Vais morrer às minhas mãos herói das dúzias…
Com que então querias que eu fosse o teu guia… Caís-te como um patinho! Eh! Eh! Eh! Vou-te passar pelas brasas e comer…Até os bigodes não deixarei escapar… Depois de bem cozidos, temperados com azeite e vinagre, serão melhores que brócolos! Eh! Eh! Eh!
Ao sexto Eh! Fred Xifarote retezou a musculatura; e com tal força o fêz que o chão estremeceu e a árvore ficou despedaçada.
Completamente livre, Xifarote arrancou das mãos do traidor a faca quási homicida. E embora por suas próprias mãos pudesse transformar o índio em pastelinhos de massa tenra, preferiu arrastá-lo pelos cabelos até Ca-xarias Town e aí entrega-lo ao Sherif…
A coragem, aliada á força héreulea, salvara de uma morte horripilante Fred Xifarote, o az, manilha e rei de todos os cow-boys…

Fonte: Jornal Infantil Tic-Tac nº 5 (15 de Janeiro de 1933)
Texto/Autor: Tio Luiz
Foto da revista
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